terça-feira, 22 de junho de 2010

Carta de um frustrado


E foi então que nos conhecemos. Numa época em que eu precisava de você e você de mim. E rapidamente nos identificamos, gostos semelhantes, interesses convergentes, pensamentos muito próximos. Porém geograficamente bem distantes um do outro. Mas quem liga pra isso? O que importa é o agora, vamos viver o que a vida nos reserva. E assim levamos o relacionamento dos sonhos. Sem cobranças, sem ciúmes, sem brigas. Somente com papos diários. E o que pintasse pra mim estava ótimo, pra você a mesma coisa. Só tínhamos um compromisso: o de sermos um do outro quando a hora nos chegasse. Até lá, continuaríamos nossas vidas normalmente. E isso funcionou. Durante um tempo...

Chegou o dia que todos os meus pensamentos eram seus. E minhas atitudes eram pra você. Meus sentimentos se fortaleceram a ponto de o “viver a vida normalmente” significar “viver a vida com você”. Desejos nasciam e eram reprimidos. O tempo e o espaço eram meus inimigos. Meus compromissos foram ficando de lado, enquanto os seus compromissos foram me deixando de lado.

E as conversas não eram mais as mesmas. Primeiro uma ceninha de ciúmes. Depois uma discussão sem motivos. Constatações pessimistas se firmando numa mente castigada pela vida. O amor nunca é a soma de dois iguais. Foi difícil admitir que a parcela recebida por mim era menor do que a ofertada. E a carência só piorava a situação. O silêncio me fazia sofrer.

Por que não fechar os olhos para a indiferença? Foi o que tentei por um tempo. Até que a Terra completou seu ciclo em volta do Sol e a omissão e o descaso apunhalaram meu coração. Teria que tomar uma decisão. Ou isso continuava e eu me afogava em frustração, ou eu acabava com o que um dia foi perfeito. Não foi fácil seguir em frente. Tentei ser indiferente também. Não consegui por muito tempo.

Tentei outras estratégias. Afastei-me, ignorei, pintei de cão, procurei em outras pessoas você... Nada funcionou por muito tempo. Meu orgulho nem existia mais. Expulsei e deixei você voltar várias vezes pra minha vida. Quando não mais forças tinha pra te expulsar resolvi conviver contigo e reprimir esse sentimento não compartilhado. Foi difícil. É difícil. Será difícil.

Nada disso é do teu conhecimento. Talvez nem do teu interesse. É por isso qie você não me merece. E apesar de eu ainda gostar de você e ainda pensar em você, tiro forças, não sei de onde, para suprimir todo esse sentimento. Não é fácil, mas noto que a cada dia eu estou um passo a mais na sua frente. E você está ficando pra trás.

Dos erros cometidos por mim não sei se extrai o conhecimento certo. Mas superficialidade está sendo a tendência na minha vida. Obrigado por me proporcionar tal aprendizado. Tenho sofrido bem menos desde que decidi assim ser. Boa sorte.

segunda-feira, 14 de junho de 2010

Eu odeio o dia dos namorados - O Retorno


E já que alguns poucos gatos pingados que lêem meu blog resolveram me chamar de mal-amado devido ao último post, aqui vai um post especial para os solteirões no dia dos namorados.

Para quem está solteiro o dia dos namorados é um dia que seria melhor se ele tivesse sido extinto do calendário. Uma data tão doce que chega a ser diabetogênica. Especialmente nesta data as pessoas estão mais carinhosas, mais românticas, acreditando no príncipe encantado, dando bom-dias com sorrisos patéticos estampados no rosto, cantando no chuveiro. Isso as outras pessoas, não você solteiro. Você solteiro acorda tarde no dia dos namorados. Quanto mais rápido o final do dia chegar mais livre da pseudo-felicidade alheia você estará.

Aliás, você acordaria tarde caso a sua vizinha chata não ligasse o som a toda altura com as músicas mais românticas da rádio. Sim, porque no dia dos namorados não se toca outra coisa que não uma música romântica. As músicas de repúdio ao sistema, de conscientização política, estão proibidas neste dia. E todo mundo liga pra rádio pra oferecer aquela música para alguém especial. Os anúncios das rádios são de floriculturas, restaurantes românticos, festas de dia dos namorados. É com isso que você é acordado no dia dos namorados. Começou o abuso.

Depois vem a chatice de ver todos os seus amigos saindo com as namoradas e você ficando em casa. É preferível ficar em casa mesmo, os restaurantes estarão lotados de casais se abraçando e se beijando e comendo, os cinemas estarão lotados de casais se abraçando e se beijando e se comendo... livraris, lanchonetes, barzinhos, shoppings, em todos os cantos eles estarão estragando a visão. E isso só vai piorar a situação crítica em que você se encontra: no auge dos seus 25-30 anos e não arranjou ninguém que lhe suportasse por mais de meia hora. Melhor não pensar nisso.

Você então pede comida pelo telefone, porque afinal, pior que dia dos namorados só o dia dos namorados cozinhando o almoço.

- Alô? Gostaria de pedir uma quentinha por favor.
- Bom dia senhor, nós estamos com uma promoção sensacional. Você pedindo duas quentinhas, uma pra você e outra pra sua namorada, você ganha um refrigerante de 600ml. Vai querer?

Maldito seja o marketeiro dessa marmitaria ‘fia duma égua’!!! Primeiro de tudo, será que alguém em sã consciência vai pedi uma quentinha para si e para a namorada no dia dos namorados? Brochante. Nessa hora você respira fundo e responde educadamente à moça:

- Não, gostaria de pedir só uma mesmo.

Quando na verdade, no auge do abudo de dia dos namorados, você quereria falar:

- Sua jegue, qual parte do “gostaria de pedir UUUMMMAAA quentinha” você não entendeu? Será que vocês da marmitaria tem algum distúrbio mental? Promoção de dia dos namorados numa marmitaria?! Ah, me poupe né minha fia, vá arrumar um namorado vá”

E então desligaria o fone rapidamente antes que pudesse ouvir da atendente da marmitaria que até ela já tem namorado. Abuso continua. É melhor você ir até a padaria e comprar algum salgado, lasanha, qualquer coisa que já esteja pronta. Chegando lá você olha para o balcão. Bolos em formato de coração com escritos EU TE AMO, decoração romântica pelas paredes, atendentes vestidas de vermelho, promoções e mais promoções... Então você vai até o balcão e pede UM salgado com UM copo de suco (ênfase no UM), sem promoção. Intrigada a atendente lhe atende. Você vai sentar e então vem a atendente minutos depois com o seu salgado pronto numa bandeja. Qual não é a surpresa ao ver o brinde de dia dos namorados que a padaria estava ofertando: um chaveiro de um casal se beijando. Abuso novamente.

Volta pra casa e resolve ir ver televisão. Quem sabe consegue voltar a dormir e o dia acaba. Liga a TV e está passando Meu Primeiro Amor. Abuso gigante. Zapeia pelos canais. Programas de namoro, de reencontros familiares, de casamentos. O jornal só passa as floriculturas e shoppings lotados. Os filmes mais melosos do mundo. Até os programas policiais de mortes estão aderindo a causa do dia. Namorado esfaqueia namorada por ciúmes, namorada se suicida ao terminar namoro, pai é morto pela filha que se apaixonou por ele. É demais para qualquer solteiro agüentar isso. Tá amarrado três vezes, em nome de Jesus, sangue de Iemanjá tem poder. E a tarde está se findando quando sua mãe percebe que você não saiu de casa e fala:

- Meu filho, você não vai sair hoje não? Dia dos namorados não é dia de ficar em casa.

Como se não bastasse você se cobrando uma namorada, ainda tem o dia lhe cobrando uma namorada e sua mãe também. Resolve seguir os conselhos dela e termina a noite na balada. Vai pra festa onde todos estão na mesma situação que você, desesperados por um relacionamento. Impossível terminar a noite só. E conhece uma aqui, conhece outra aculá, troca telefones ali... No final da festa, você ficou com várias, pegou o contato de todas. Foi muito bom conhecer tanta gente carente e suscetível. Porém o dia dos namorados acabou. No outro dia, a cobrança que você tinha sobre você desapareceu junto com o dia dos namorados. Então você volta a ser o solteirão sem um pingo de vontade de se relacionar com ninguém... até o próximo dia dos namorados.

sexta-feira, 11 de junho de 2010

Dia dos namorados


Para você que é homem, acorda cedo no dia dos namorados, tem toda uma programação arquitetada na cabeça de como será o dia. Vai primeiro lavar o carro, depois toma um banho de 10 minutos, tira a barba e corre pra casa da namorada. Se for mulher, vai ter que acordar mais cedo ainda e preparar todo o arsenal para a chegada do namoradão: depilação total, prancha/escova/alisamento no cabelo (pintar se preciso for), pintar as unhas... tudo isso antes dele chegar.

Ocorre então a troca de presentes. Ele nunca entende as necessidades da namorada e dá uma lingerie vermelho puta que grita "trepe comigo esta noite", um buquê de rosas e um chocolate em formato de coração com os dizeres EU TE AMO. Ela sorri, agradece, dá um beijinho nele e enquanto isso pensa: "Viado! Estou uma gorda baleia, não vou usar isso nunca, porque que ele não deu isso pra mãe dele? E o chocolate? Estou na dieta da VACA (comendo grama) há um mês e esse baitola vem e me dá essa droga de chocolate deliciosa. Jesus me conceda o prazer de emagrecer 10kg pra caber nessa lingerie. Ele quer ver meu cu mastigando essa calcinha, mas desse jeito ela não passa nem na minha cintura. E esse buquê de rosas? Amanhã eles apodrecem, pra quê que eu quero isso? LIXO!" Daí, ela entrega o presente dela pra ele, um kit numa cesta com uma caneca do time predileto dele, um perfume, conjuntinho toalha-sabonete-creme de barbear e uma carta romântica escrita à mão. Ele sorri, agradece, dá um beijinho nela e pensa: "Vadia, gastei fortunas com a lingerie e ela vem e me dá conjuntinho toalha-sabonete-creme de barbear. Com certeza o pai dela ganhou isso em algum bingo para idosos e ela roubou e está me dando. E essa colônia barata? E essa carta? Serve nem pra limpar o cu porque é duro demais e arranha. A única coisa que eu gostei foi dessa caneca do meu timão." Ou seja, não adianta, você nunca acertará o presente certo que o seu namorado quer ganhar. Se você perguntar talvez você acerte, porém quem é que pergunta qual o presente ele quer ganhar? Vai estragar a surpresa. E assim começa o grande dia dos namorados, ambos chateados com os presentes, mas iludidos com o que ainda pode acontecer de bom naquele dia.

E então rumam para o almoço do dia dos namorados. A cidade inteira resolveu se refugiar nos restaurantes. Se o cara estiver tentando agradar a garota ele a leva para o Self-Service. Fila quilométrica, comida gelada, preparada às pressas para suprir a fome insaciável do povão. Se você não for pro Self-Service você vai ter que ter rezado 10 terços e feito uma novena inteira nos 5 dias anteriores pra conseguir um canto pra se sentar e depois que se sentar conseguir um garçom livre pra lhe atender. Você escolhe aquele prato especial do dia dos namorados que custa 169.99 e chora sangue por dentro por causa do preço. Daí vem a pior parte, a espera. Duas horas depois talvez eles estejam preparando o seu prato. Com muita sorte o garçom não errará de mesa e entregará o pedido pro casal certo (são todos iguais). Pronto, agora estão alimentados finalmente.

Depois do almoço, tem aquele cineminha pra vocês ficarem mais juntinhos, poderem namorar um pouquinho escuro, aquele clima romântico... Chegando lá se depara com uma fila filha da puta. Bobagem, o que importa é estar junto de quem se ama. Enfrentam a fila bravamente e na hora de comprar ingressos pro filme Romance Eterno dos Amantes Apaixonados você descobre que acabaram os ingressos e que só tem ingresso disponível para o filme Guerra Infernal Sangrenta. Fazer o quê, já que estavam ali o casal topa assistir ao filme, o que importa é que possam namorar um pouquinho no escuro, estar juntos aquele dia. Entram na sala e se deparam com centenas de casais que tiveram o mesmo azar que você de chegar atrasado. Porém eles pelo menos estão juntos. Depois de 20 minutos de busca frustrada por assentos vizinhos o casal desiste e assiste ao filme distantes 9 cadeiras e 2 fileiras um do outro. O filme era uma chuva de sangue só. A quantidade de sangue jorrado durante o filme era desproporcional à quantidade de pessoas que atuaram nele. Aquele ali nunca ganharia um Oscar. E então o namoro no escurinho vai por água abaixo da pior forma possível, com casais se beijando ao redor e gritos e gemidos (não é isso que vocês estão pensando) de pessoas mortas na guerra do filme.

Ainda tem o jantar do dia dos namorados, será igual ao almoço, com a diferença que demorará mais ainda.

E pra terminar a noite, a passadinha no Motel. Logo na entrada, fila pra entrarem os carros. Está lotado lá dentro, então espere na fila pela sua vez. Parece Drive Thru, faz o pedido, pega e vai embora comer em casa, com a diferença que no motel você come o pedido antes de ir pra casa. E depois da espera você finalmente adentra aquele quarto. O cheiro de Desinfetante com Bom Ar para disfarçar o cheiro de sexo do ar. Sinto pena das arrumadeiras de Motel no dia dos namorados. Elas devem trabalhar muito, precisam fazer a mágica de desaparecer todos os vestígios do casal anterior para o casal precedente vir e aproveitar o fim do dia dos namorados. O casal faz o bem bom em uma hora e as arrumadeiras desfazem tudo em poucos minutos. Imagino elas entrando nos quartos correndo com vassoura, pano de chão, desinfetante, rodo... internamente elas gritam: xô AIDS, xô sífilis, xô herpes, xô DSTs, xô camisinha lotada, xô xô xô... Elas deveriam trabalhar com roupas impermeáveis completamente fechadas, ali se pega vírus até pelo ar. Prefiro trabalhar com radiação. E imediatamente elas correm embora do quarto, pois o próximo casal está chegando pra ocupar. Mas voltando para o fim do dia do casal... finalmente o momento tão esperado, a trepa básica de fim de noite no Motel. Ela doida pra que ele repare na depilação a laser que ela fez naquela manhã, que repare na calcinha engolida pelo cu que ela está usando desde o início do dia (deve estar toda assada certeza), que ele repare em qualquer coisa nela... O máximo que ele faz é tirar a roupa dela rapida e rudemente e soltar as palavras mágicas: GOSTOSA. Pronto! Ambos enlouquecem fazendo amor rapidamente, pois precisam terminar o serviço em 30 minutos (lembrando que a tabela de preços do motel aumenta em datas comemorativas). No final, a calcinha está imprestável para se usar novamente, o ato acaba tão rapidamente como começou e eles se arrumam como podem, pois o dono do estabelecimento já bateu na porta do quarto gritando CINCO MINUTOS. E então eles saem em disparada corredor afora. E a arrumadeira corre quarto adentro.

E assim acaba o lindo dia dos namorados.

quarta-feira, 9 de junho de 2010

... e ela me faz tão bem que eu também quero fazer isso por ela...

* Ela já foi minha filha e gritou "A GALINHA POS UM OOOOOVO!", me impedindo de matar a galinha e me fazendo ter uma epifania. Afinal, ela tinha gerado uma vida e nós não poderíamos tirar a vida dela. Só Rosa Rolim entendia Clarice Lispector.

* Ela também chegou a ser uma princesa. Eu fui um porquinho que perdia a casa e ia morar na Aldeota. E tinha uma chapeuzinho vermelho e um bruxo chamado Malvadiel. E íamos nos apresentar para uma super platéia de crianças nossa super elaborada história. Não lembro de ter visto tanto público assim. Mas foi divertido, tirando a briga por causa das roupas.

* Ela era sempre o primeiro lugar da sala, alimentando minha frustração de segundo lugar desde que me entendo por gente.

* Ela respondeu a pergunta mais difícil do Hevertinho sobre Botânica (acho que era O que são espermatófitas), salvando minha equipe do fracasso total.

* Ela foi pra turma especial comigo. Tá certo que ela nem gostava do povo, mas eu acredito que eu era uma das pessoas que ela ainda tolerava. Apesar de neste ano termos tido nossa primeira briga, sabe-se lá porque. Sei que ficamos sem nos falar um tempo, mas no final tudo se resolveu.

* Mentira! No final nada se resolveu. Levamos bomba no vestibular. E eu acabei indo parar em outro cursinho. Passamos um ano separados, nos vimos praticamente 4 vezes durante o ano inteiro e eram encontros meio que distantes. Nada era como antes, mas eu acreditava que no final as coisas se resolveriam.

* Mentira denovo, as coisas não se resolveram no final, levamos outra bomba no vestibular. Mas finalmente eu pude voltar a estudar com ela. E então as coisas voltaram a se encaixar, voltamos a nossa amizade de com força.

* "Odeio seus amigos novos!" - frase dita pelo menos uma centena de vezes aquele ano. Conheci novas pessoas (maravilhosas por sinal), mas ela não queria de jeito nenhum que eu me apegasse a mais ninguém. Possessiva!

* Esperar ônibus nunca foi uma coisa divertida, mas esperar o 625 - Parque Manibura Borges de Melo com ela na praça do BNB era ótimo. E comer batatinhas fritas encharcadas de óleo do tio era ótimo também.

* E ela é a melhor interpretadora que existe. Interpretou a abertura de A Favorita, interpretou Do Sétimo Andar, interpretou Bad Romance...

* Ela me dava conselhos amororos, porque numa certa época acabei me apaixonando, não dizia por quem, mas ela lia pensamentos. E dizia que minha alma gêmea era outra, que um dia ainda terminaríamos juntos.

* E nossas famílias apostavam no nosso namoro. Acredito eu que até hoje eles ainda guardam aquela torcida. Um dia quem sabe...

* E ela tinha o Murilo e o Venâncio pra diminuirem a solidão dela. E ela ainda pensa que eu não ajudei a dá-los. Segredo: eu ajudei sim.

* Ela fez um M na minha cabeça quando eu passei.

* E no terceiro dia, Jesus não ressuscitou. NÓS RESSUSCITAMOS.

* Ir pra praia à noite pode até parecer o convite para a sacanagem... E era. Ela levava a canga, a gente se deitava em cima e ela começava a contar as coisas mais cabulosas que já tinha feito. E eu bolando de rir. E ela com ódio porque eu não contava nada.

* Viciei ela numa banda que estava com os dias contados. E ela me culpa eternamente por gostar de uma banda e nunca ter podido ir a um show deles.

* E daqui a exatamente 10 anos, dependendo das condições amorosas dos agentes envolvidos, ela estará gerando nosso filho.

* Ela me ensinou a encher o pneu do meu carro. E vive me chamando de barbeiro, mas pelo menos não fui eu que dirigi com o freio de mão levantado e com os faróis apagados em plena BR-116. Nem bati no estacionamento do Iguatemi. Ah claro, foi a parede que veio pra cima do carro...

* Ela é doida pra vir aqui pra casa, eu prefiro a casa dela, ela é doida pra ser igual a minha mãe, eu sou doido pela sobremesa da mãe dela, minha vó é a vó dela, ela me secretaria (ou secretariava) junto aos plantões do irmão dela (inclusive graças a ela poitei a formatura dele), ela é tia do meu afilhado...

* Passamos por tanta coisa juntos que poderia passar horas escrevendo. Mas vou ficar por aqui, pois preciso pensar em alguma coisa pra dar pra ela. Afinal, o analista de sistemas embaçou todos os meus presentes. Esses são apenas resquícios do que fomos, do que somos e do que seremos.

sexta-feira, 4 de junho de 2010

Sonata da Monotonia


E ela não tem muitas pretensões na vida. Agrada a ela o fato de ser uma profissional medíocre. Medíocre para muitos pode ser um insulto. Não para ela. Não pretende ser notada. Quer ser mais um parafuso que faz funcionar a enorme máquina. Não leva trabalho pra casa. O que deve fazer no trabalho faz no trabalho. Nem mais, nem menos. Nem elogios, nem broncas. E no final do expediente vai pra casa. Mora só. Não tem namorado. Apenas um cachorro. Ligeiro passeio pela rua com o cachorro. Anda o suficiente. Fez cocô, fez xixi, volta pra casa. No caminho nada demais. Bêbados e prostitutas. No aconchego do lar esquenta a comida. De ontem? Anteontem. Não importa. O gosto está tão ruim quanto no dia. A pia acumula mais um prato, mais um garfo. E a geladeira acumula o resto da comida. Vai pro banho. Sai do banho. Veste a camisa larga dele. O cheiro dele impregnado. Deita no sofá. Liga a TV. Fecha os olhos e torce pra dormir antes de 4 da manhã. Notícias, filmes, riscos. Tudo passa na TV. Só o tempo não passa. E o calor. Depois de horas ela se levanta. Prepara um banho quente. E um leite gelado. E volta a deitar. E na hora sagrada enfim desfalece. Sonhos. Pesadelos. 2 horas depois acorda. Telefone. "Alô? Não, não tem ninguém aqui com esse nome." Adeus son(h)o. Respira fundo e vai se arrumar. Não pode chegar atrasada ao seu trabalho medíocre. Tem de ser medíocre só mais hoje. Só mais um dia.

quarta-feira, 2 de junho de 2010

24 HORAS


Os acontecimentos a seguir ocorrem entre 00:00 e 8:59 do dia 31 de maio de 2010.

00:OO
- O que ainda falta? Artrite Reumatóide, Cushing, Addison, Osteoporose, Osteoartrose, Diabetes, Artrite Idiopática Juvenil, Hiperprolactinemia, Tumores hipofisários e Câncer de tireóide. Ah, ainda é meia-noite, claro que dá tempo. Vamos concentrar e continuar.

1:00 - Hum, interessante essa tal de Artrite Reumatóide, uma poliartrite de pequenas e médias articulações, com rigidez matinal maior que uma hora, deformante, com nódulos reumatóides, podendo complicar com vasculite... Bacana. O que vem agora? Ah, Osteoporose... Ufa, terminei essa osteoporose, rápido, não perde tempo, Tumores hipofisários MODE ON.

2:00 - Eita dor nas costas feladaputa. E essa luminária ainda tá sem a luz (quebrei a lâmpada nova tirando da caixa), tô ceguin. Vamos continuar, falta pouco, Artrite Idiopática Juvenil... Que saco, não tem onde estudar isso, não tem no livro. E agora? Pula, Hiperprolactinemia agora... Putz, que chata essa matéria... e que sono. Falta pouco, paciência.

3:00 - O que será que está passando na TV agora? FOCO ERLON, DIABETES. Tô cheio de séries no laptop, podia descansar um pedacinho e assistir um episodiozinho de Grey's Anatomy. FOCO ERLON, DIABETES. Tá, Grey's Anatomy não que é muito longo o capítulo, mas The Big Bang Theory são só 20 minutinhos, não vai mudar nada e vai dar tempo de terminar a matéria. Vou só terminar esse parágrafo e... kkkkkkkkkk muito bom esse episódio, esse Sheldon é uma figura, mata-me de rir. Voltemos agora para Diabetes. Ow capítulo medonho.

4:00 - Então o que você perscreveria para um paciente com uma poliartrite com exame laboratorial de anti-CCP positivo? Insulina, pois é um corticóide que quando usado cronicamente pode dar Doença de Addison. Tumores hipofisários podem comprimir o quiasma óptico e resultar num hiperparatireoidismo. Isso pode ocasionar amenorréia, galactorréia e virilização, mas é facilmente tratada com rituximab. Tão bom saber que estou entendo toda a matéria. Apesar do cansaço vou continuar, está sendo totalmente efetivo esse estudo, vou só ali comer algo... Hm, ovos, com pão dormido (literalmente ele deve estar dormindo mesmo, a esta hora só eu ainda pelejo), queijo, manteiga, bolacha Cream Cracker, capuccino... Puta que pariu! Derrameu capuccino em cima do livro novo de Endocrinologia da biblioteca. Eita caralho! Perde tempo não, pula esse capítulo demoníaco de Diabetes. INFERNO!!!

5:00 - FUDEU! Não vai dar tempo, puta que pariu. Quem trata Osteoartrite? Quais os critérios diagnósticos do LES? Qual o adenoma mais prevalente na acromegalia? Tá tudo se misturando na minha cabeça. E não vai dar tempo de terminar a matéria (pra variar), vou tirar nota baixa (pra variar), vou passar o dia com sono. CACETE. E o pior. Tá chovendo, pra que clima melhor pra dormir? Ai ai ai, #putafaltadesacanagem. Vou folhear os livros pra ver se alguma coisa pula lá de dentro pra minha cabeça... Vaila, acordei, estava dormindo em cima do livro, até babei a folha do livro. Eita, o mesmo livro de Endocrinologia novo da biblioteca. Tinha capuccino, agora tem baba, vai começar o processo digestivo nas folhas, quando eu entregá-lo mais tarde vai estar todo corroído. Caralho, tá amanhecendo, tem jeito mais não.

6:00 - Pronto, chegou a hora de parar e admitir que eu vacilei, deveria ter estudado mais, não ter acumulado a matéria, ter assistido menos séries, ter saído menos e todo aquele papo de gente arrependida. MERDA! Não adianta nada se lamentar, é levar bomba daqui a pouco e se preparar pra próxima. Dessa vez eu vou mudar e estudar mais (Jura! Hanran, senta lá Cláudia). Relutantemente vou fechar esse livro e tomar banho. Passar a madrugada estudando, amanhecer com a certeza de não saber de nada, com as costas doendo, os olhos ardendo, só um banho gelado pra piorar mais ainda. Ah, e tá chovendo... Escovando os dentes... Tomando um copo de leite... Me arrumando... Ainda bem que parou de chover, não gosto de levar guarda-chuva, se perco celular sem ver nem pra quê, imagine guarda-chuva... Opa, o que foi isso? Uma gota de chuva? Não começa São Pedro, fica na tua e para de cuspir em cima de mim. Acho que ele ficou com raiva desse pensamento blasfêmico. Aos poucos começou a tertulha lá no céu. Só mais alguns quarteirões (5) até chegar à parada. Não vou correr, a chuva ainda tá fraca, dá pra pegar essa chuvinha bexta até lá. Só vou ter que tomar cuidado com esse livro, sim, o mesmo livro de Endocrinologia novo da biblioteca sujo de capuccino e baba e agora molhado pela chuva... Ufa, cheguei na parada, óculos invisualizável, cheio de pingos, camisa úmida, mas nada demais, agora é esperar o ônibus, ou quem sabe uma carona.

7:00 - Finalmente meu ônibus chegou, pelo menos não vou chegar atrasado à prova e essa chuva vai parar quando eu chegar lá. Lotado o ônibus. Tem coisa pior do que acordar cedo, num dia de chuva, pegar ônibus e ele vir lotado? Pior que isso só se você não acordar, igual eu, já que eu nem sequer dormi... É, viva o pensamento positivo (¬¬'), olha o toró maior do universo que tá caindo? Vou ficar aqui esperando essa chuva forte passar... Parece que ela não vai dar trégua, já são mais de 7:30 e essa chuva não passa, minha prova é pra ter começado já... E ainda tem esse livro da biblioteca pra cuidar, se bem que ele já tá tão sofrido. Posso até colocar ele na minha cabeça pra proteger pelo menos meus óculos dos pingos de chuva que me cegam... Pronto, é agora, a chuva deu uma aliviada, vou aproveitar que o sinal está fechado e vou atravessar a rua e ficar protegido na guarita em frente a faculdade. CORRE POBRE! E a chuva resolveu castigar nos 50 metros que tive que percorrer. Claro, reparei tarde demais que correr é pior que andar. Andando a gente pega chuva de cima, correndo a gente pega a chuva de cima e pisa com força nas poças do chão e elas sobem bem em cima de você, principalmente quando as poças passam do tornozelo (como era o caso). Enfim, cheguei ao destino meio molhado, mas o livro ainda conservava suas folhas, ele não tinha se desintegrado (ainda!). E o caos pela cidade. Os carros passavam com água na altura do pneu, um até parou no meio da rua. A correnteza cada vez maior, os carros jogando água pros lados. E foi quando eu vi o portão de entrada da faculdade. Água na altura do meio da perna, com direito a correnteza. Show, já que o livro da biblioteca estava já todo molhado, sujo de capuccino e de baba, eu bem podia tentar subir em cima dele e sair surfando. Era uma boa. E a prova já devia ter começado. E eu ainda tinha que percorrer o maior percurso de todos sem um localzinho onde pudesse me proteger da chuva... Não dá mais pra esperar, vou correr o mais rápido possível, talvez sobreviva. Chegando ao portão de entrada fui lutar contra a correnteza, ela me carregando, se não tivesse uma prova e um livro novo nas mãos eu me deitava agora mesmo nessa poça d'água e esperava ela me levar até sei lá onde. E a chuva castigando. Senti os olhares do povo sobre mim, senti a angústia deles, todos estavam torcendo para que eu sobrevivesse àquela epopéia, imaginei até eles batendo palmas para mim quando chegasse do outro lado com vida. Pra falar a verdade o povo deve ter rido muito daquela putaria toda, um idiota na chuva com um livro na mão correndo/nadando/sendolevado. Mas como dizia Murphy, ainda pode piorar. A chinela, não satisfeita com minha situação crítica naquele momento, resolve se soltar do meu pé e ser levada. Dei meia volta e corri atrás da chinela. Pelo menos agora eu estava a favor da correnteza, foi fácil. Dou um mergulho, alcanço minha chinela lá no fundo da poça e calço denovo. Recuperada a chinela e passada a fase "Piscina com correnteza" só me resta agora correr, correr muito... É, viva a minha boa forma, estou ofegante, atrasado para a prova, completamente ensopado. Tô com pena é desse livro aqui. Criamos toda uma história, um envolvimento, uma relação leitura-leitor holística, mas graças a Deus vou devolvê-lo. Ele é muito pesado para eu ter que trazê-lo novamente outro dia... Muito lindo, a biblioteca não está funcionando hoje. Deu goteira e os livros foram todos molhados. kkkkkk Pelo menos não foi só o meu que pegou chuva. Ruim é ter que levar esse livro deste tamanho de volta pra casa. Tomara que pare de chover.

8:00 - UFA! Ainda bem que a prova não começou ainda... Eita começou a prova... Caralho que prova demoníaca... Puta que pariu, que matéria é essa?... Eita, tem gente pescando... Hm, que sono bom... Existirá vida após a Medicina? Durante eu sei que não existe, mas e após? Acho que nem Jack Bauer sobreviveria a isso, ele prefere desarmar bombas, prender a máfia russa, descobrir traficantes de drogas, salvar o presidente dos EUA e salvar o mundo, do que passar por essa peleja. FOCO! Qual o tratamento do Lúpus mesmo? Octreotide?